A cidade que aprendeu a ensinar

Três dias em Sobral, no Ceará, me trouxeram várias lições; a maior delas é que todas as crianças do município têm garantido o seu direito à educação de qualidade

por Paulo Emílio de Castro Andrade*

Não é de hoje que Sobral, no Ceará, desperta a curiosidade de quem trabalha com educação. É que muito se fala dos resultados de aprendizagem das crianças do município que é destaque nacional: em 2021, por exemplo, 9 escolas sobralenses ficaram entre as 100 com melhores resultados do país. No mesmo ano, a rede municipal ficou em 1° lugar nos anos iniciais do Ensino Fundamental, considerando o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) das cidades com mais de 50 mil habitantes. Trocando em miúdos, podemos dizer que quase todas as crianças que estudam em escolas municipais de Sobral aprendem a ler e a escrever na idade esperada.

Estive em Sobral, junto com um grupo de educadores e outros profissionais de instituições da educação. Ao longo de três dias, visitamos escolas e conversamos com professoras, diretoras e gestores da Secretaria de Educação. Durante a visita técnica, fiquei me perguntando: o que é que Sobral tem de tão diferente? A resposta é que não há uma única resposta, é um conjunto de ações que acontecem de forma bem organizada, há bastante tempo. Escolhi três elementos para trazer para vocês, que acho essenciais:

Primeiro, as equipes da Secretaria de Educação e das próprias escolas têm uma forte preocupação com a presença e a aprendizagem das crianças e adolescentes. Há acompanhamento diário de quem foi e de quem não foi à escola. Há várias estratégias para garantir que as faltas dos estudantes sejam algo pontual. Acreditam que todas as crianças podem aprender. Ou seja: a meta é garantir que todos estejam na escola, e, uma vez na escola, é preciso criar as condições para que todos os alunos se desenvolvam. Isso ficou claro nas três escolas que visitei: tinha sempre um quadro com os nomes dos alunos que faltaram – para que a gestão cuidasse de trazê-los de volta no dia seguinte – e as aulas aconteciam sempre considerando como as crianças e adolescentes aprendem.

Outro ponto que chamou a minha atenção é a valorização dos professores. Há todo um trabalho para que as escolas tenham professores em quantidade adequada e, com isso, tenham tempo para planejamento e formação. Um dia por mês todos os professores de todas as escolas municipais vão até a Escola de Formação Permanente do Magistério e Gestão Educacional. Participam de uma formação continuada, que conecta teoria e prática, possibilitando que os profissionais construam, juntos, soluções para os desafios que enfrentam no dia a dia.

Por fim, essa rede de ensino desenvolveu a capacidade de manter o foco e de trabalhar com simplicidade. A impressão que fiquei é de que eles não se distraem com o que não é essencial. Sabem o que é o importante: a presença e o desenvolvimento de todos os alunos. E aprenderam que, para isso, não é necessário nada de outro mundo. Trabalham sem firulas: escolas limpas, com estruturas adequadas, crianças presentes, professores com boa formação e preparados para os desafios que enfrentam, gestão focada em garantir as condições para a aprendizagem. Tem mais, claro. Mas isso já é muito!

*Este artigo foi originalmente publicado no portal da Rádio Itatiaia, na coluna fixa de Paulo Emílio de Castro Andrade. Paulo é presidente do Instituto iungo, professor da PUC Minas e pesquisador do Núcleo de Novas Arquiteturas Pedagógicas da USP.