Quando as famílias procuram escolas para crianças menores de seis anos, geralmente prestam atenção no parque, nas áreas livres, nos brinquedos disponíveis. Para professores, o pensamento também não é diferente: crianças de até 10 anos precisam brincar. Nas aulas, também há tempo garantido para essa faixa etária, com brinquedos, livros e jogos que favorecem a aprendizagem. Porém, vira e mexe surgem dúvidas sobre qual o tempo ideal. Por exemplo: o recreio deve ser totalmente livre para crianças correrem e brincarem como quiserem, ou professores devem coordenar essas brincadeiras? De toda forma, há o tempo do lúdico para os pequenos.
O problema começa a existir quando as crianças crescem mais um pouco. No sexto ano, a quinta série do meu tempo (e acho que de muitos leitores), normalmente se perde o direito de levar brinquedos para a escola, e o tempo para brincar acaba sendo reduzido, ocupado por mais aulas, cadernos e livros. Muitos estudiosos, observando isso, realizaram pesquisas sobre a necessidade de ter espaço para o lúdico também para as crianças e adolescentes entre 10 e 17 anos na educação, ou seja, é importante não perder o fator humano, necessário a todos nós, que é o brincar, mesmo que a brincadeira mude e se torne mais desafiadora, conforme eles crescem. Sim: brincar é preciso!
Precisamos brincar e isso deve ser compreendido como algo que anda junto com o aprender. Quando não sabemos algo e sentimos curiosidade, normalmente nos lançamos na aventura de descobrir. Quando isso acontece, investigar se torna tão prazeroso quanto qualquer jogo. Aliás, falando em jogo, todos trazemos em nós memórias de risadas e momentos felizes em família com jogos de tabuleiro, ou com uma bola entre amigos. E ninguém nega que todos esses jogos da infância e da juventude trouxeram excelentes aprendizados.
Lembro de momentos de riso intenso e aprendizagens marcantes com meus alunos, nos divertindo juntos ao mesmo tempo em que preparávamos uma exposição. Em encerramentos de projetos de pesquisa, que incluíam música e dança, em viagens de estudo do meio, em atividades de contação de histórias com jovens do Ensino Médio para os pequenos da Educação Infantil. Ou mesmo em situações inusitadas que criavámos, como uma invasão poética em outra turma, com declamação de autores que eles haviam estudado. Em todos esses momentos, eles aprendiam arte, literatura, habilidades manuais ou procedimentos investigativos. *Aprendiam a aprender e conviver.
Porém, ainda assim, você que acompanha esta minha coluna, talvez esteja se perguntando: após temas sérios como Amazônia e Educação Antirracista, por que falar sobre brincar? A resposta está na realidade complexa que vivemos e que abrange questões desafiadoras como o enfrentamento das mudanças climáticas e a construção de uma sociedade sem racismos. O tempo de brincar é fundamental para que haja tempo de sonhar e de desenvolver aprendizados sociais.
Aprendemos uns com os outros e nisso, está incluso o diálogo entre famílias, crianças e jovens, entre professores e estudantes, com amor, leveza, risadas, curiosidade, jogos de descobrir, de investigar, de criar, de viver. A educação está em todos os espaços e arrisco defender que não há ciência, não há conhecimento que não caiba em um viver-brincar como esse. Conquistar os jovens para isso pode, sim, começar com uma brincadeira.
Este artigo foi originalmente publicado no portal da Rádio Itatiaia, na coluna fixa de Alcielle dos Santos. Alcielle é diretora de educação do Instituto iungo, doutora em Psicologia da Educação e mestre em Educação: Formação de Formadores.
*Esse é um dos pilares proposto no relatório para a UNESCO, da Comissão Internacional sobre Educação para O Século XXI, “Educação – um tesouro a descobrir”. São eles: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser. Liderado pelo então então presidente da Comissão Internacional, Jacques Delors (2010), o estudo reforça a educação como indispensável para uma uma verdadeira equidade no mundo. (DELORS et al, 2010, p. 31). Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000109590_por.